Sunday, November 27, 2011

breve ensaio sobre as estações (iii)

outono

não se sabe que é outono olhando pro céu; no outono a gente olha pra dentro como quem olha pro chão pra não tropeçar. não tem encontro, não tem susto, não tem paixão. outono é vento e vento e vento e tempo do prazer de pisar em folhas secas. é vernal o prazer fugidio e sutil porque suspenso e portanto enganador: transmutar volatilidade em permanência não é justo. e por isso a ventania.

expiração

'qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura'.
guimarães rosa

é no seu abraço que eu sou um pouquinho mais sã,
quando sinto sua pele dar alento à loucura.
é seu corpo todo que me benze, me dá febre curadoura
e me restaura em graça, riso e paz.
é seu sorriso que me oferece mais
confiança no mundo que ancora
minha coragem rainha,
descoberta e fugidia
num tempo de soluço
é no seu braço meu reino destemido,

e em fé e força esgarço, sem pudor nem ranço de cansaço,
a bainha da sua roupa em que cravo
minh'alma e minhas unhas, quando no seu abraço.

Saturday, November 05, 2011

benvinda

o que denuncia um novo amor não é um novo orgasmo (isso é transa casual), um novo velho mesmo jeito de atender ao telefone (pode ser timidez), nem as tão batidas borboletas no estômago (é claro que las hay, pero desde a pré-escola). o que denuncia um novo amor é aprender um novo jeito, o jeito dela, de arrumar a cama. e tomar gosto. e zelar pela cama arrumada, vez ou outra, antes de sair.

olavo bilac

Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
e triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
e alma de sonhos povoada eu tinha.

E parámos de súbito na estrada
da vida: longos anos, presa à minha
a tua mão, a vista deslumbrada
tive da luz que teu olhar continha.

Hoje, segues de novo... Na partida,
nem o pranto os teus olhos humedece,
nem te comove a dor da despedida.

E eu, solitário, volto a face e tremo,
vendo o teu vulto que desaparece
na extrema curva do caminho extremo.