A Internet é o mais contemporâneo paradoxo. É, simultaneamente, o lugar onde muitas pessoas sentem-se incrivelmente à vontade, e um permanente não-lugar – a partir daí, torna-se ponto de não-retorno. Talvez pela intimidade e hospitalidade, por um lado, da rede poder fazer sentir(-se/lhe), seja despertado o sentimento – ou o sentido – de liberdade individual inalienável e quase que incondicional. Talvez por estarem no conforto de seus lares e protegidas por uma membrana (in)transparente, as pessoas – ou melhor, os internautas – sintam-se tão à vontade para mostrarem-se nus perante seus companheiros – e a intenção da frase era metafórica, mas o literal também se a carapuça serviu... A questão é se se mostram de fato, inteiros, íntegros e intrínsecos àquilo que são, ou se criam personas, personagens e facetas, inspirados em seus melhores, piores ou (im)possíveis.
Pois bem, o buraco é muito mais embaixo. Caímos no relativismo da discussão sobre o ser. Eu, particularmente, acredito que não somos; estamos. E, por estarmos, somos quase que polivalentes, ou multifacetados, ou divisíveis. É o constante estado de estar o responsável pela instabilidade de muitas mentes internéticas e perfis de orkut – vide os constantes ‘orkuticídios’ cometidos. Entretanto, a discussão entre o ser e o estar é convergente se comparada à já também exaustivamente discutida questão de regressão – à medida que desenvolvemo-nos – entre o ser/estar e o ter.
Li ontem na folha Mais! Um excelente artigo no qual o autor aprofunda essa digressão e faz-nos (de)cair: hoje, em nossa ocidentalóide sociedade, o que impera não é mais sequer o ter: é o parecer. Nesse sentido, completamos nosso esquema e a Internet torna-se extremamente lógica: é lá que criaremos nossas diferentes personas, é para lá que transportaremos nossas frustrações e as dividiremos e acharemos graça. É na Internet que as pessoas fogem da solidão e se masturbam simultaneamente diante de uma webcam. É lá que preconceitos nazistas, racistas e homofóbicos se espalham. Talvez a criatura tenha vencido o criador e, de fato, o homem tenha tornado escravo de seu caráter patético, o qual é devastadoramente inflado pela Internet.
Guy Debord escreveu, em 1992, um livro fascinante chamado “A sociedade do espetáculo”, no qual teoriza que “toda a vida das sociedades nas quais reinam as modernas condições de produção se apresenta como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era vivido diretamente tornou-se uma representação”, e explica: “do automóvel à televisão, todos os bens selecionados pelo sistema espetacular são também armas para o reforço constante das condições de isolamento das “multidões solitárias”. Pá-bum: a internet, o espetáculo.
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6 comments:
Uou, vai com calma!
Nossa, mesmo não estando num dia nada pro para um texto dessa profundidade, realmente muito bom.
Concordo, Sté: estamos, não somos.
Tenho que confessar que vou precisar reler algumas vezes, porque m,inha cabeçinha de vestibulando anda meio preguiçosa pra se exercitar com coisas interessantes.
Se eu fosse a marisa, dava 9,0
Porque essa coisa de colocar prefixos e sulfixos entre paresntes as vezes pareceu-me um porquinho desnecessaria.
MAs meu deus, você já cansou das férias, é? =P
Te amo, menina inteligente, dentro e fora =]
onde está escrito: "mesmo não estando num dia nada pro para um texto..."
Entenda: "mesmo não estando num dia nada bom para um texto..."
Tô falando, minha cabeça ta uó ¬¬'
ainda mais com a pornografia!
viver não vale a pena; olhar vale a pena, sonhar vale a pena.
nossa!
acabei de jogar tudo isso na cara de uma pessoa e venho e leio seu texto...!
minha alma gêmea, sem dúvida xP
achei que abusou um pouco nos parênteses também, mas isso pode se desenvolver em uma iniciação científica hehehe
apesar de eu ficar em dúvida, talvez este esteja muito pop...
Bem bacana o post. É isto aí, mesmo. Só uma coisa - "A Sociedade do Espetáculo" não é de 1992, mas sim de 1967. Tinha que ser assim, já que os movimentos "anti-arte", como o Fluxus e os Situacionistas Franceses (do qual fez parte o Debord), influenciaram o punk. Que, como sabemos, é do meio dos 70.
De resto, excelente texto.
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