peço-te que imagine
uma linha.
imagine o diâmetro
exato de seu fio
e se existe ou não um
buraco possível de agulha para se fazer travessia.
imagine sua cor,
nuançada entre um tom de céu ou areia
ou talvez nenhum desses
mas aproximadas cores de lembrança
ou precisas e
irresolutas, inelutáveis cores de sonho
quando num continuum
diálogo de vigília e só se sabe sonho porque
não sentes dor
o absurdo
denuncia
o despertar deixa
a dúvida e portanto: sonho
peço-te que então
imagine de que é feita essa linha.
se do mais comum
material encontrado na natureza
encapsulado e doravante
produzido
em fábricas por
homens comuns
em vilas por
eco-propostas
e consumido como
requinte;
se de um raro material;
quão denso;
se escapa, desfia, desfaz, solta pedaços bolinhas farpas pó no [manuseio;
se escapa, desfia, desfaz, solta pedaços bolinhas farpas pó no [manuseio;
se num emendo
artesanal;
mais ou menos longo;
se sob intervenção
infantil multicolorida e dura (pintada com guache) [e esgarçada (do
contato com as unhas);
quão maleável.
não me diga nada dessa
linha e não a tente reproduzir.
essa linha é o que te
é e não me é possível compreendê-la ou imaginá-[la.
podemos, contudo, tomar
aulas de arte
e aprender teorias
contemporâneas e estudar produções de [assemblage
estudar construção de
esgoto e sustentação de casa (é claro que a [linha pode vingar)
enforcar um inimigo
dançar melodias e
bater palmas ritmadas
saltar do ônibus no
ponto errado
suar a camisa ao passar
por alfândegas
cozinhar massas
acompanhadas de peixe fresco
colecionar rótulos de
importados e pedras não-lapidadas
arriscar um lançamento
de pedra e receber bombas que nos fazem [correr
tirar roupas do varal
tamborilar na espera
e fazer, no descanso,
ponto-cruz.
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